A parceria entre o guitarrista norte-americano Anthony Wilson, um apreciador de bossa nova e MPB, e o violonista/guitarrista paulistano Chico Pinheiro, um autodidata de grande talento, deu como resultado o álbum Nova, lançado em 2007 pela gravadora Buriti. Membro da banda de Diana Krall, Wilson sugeriu o encontro dos músicos, pois ficou impressionado com a musicalidade do brasileiro. Mesclando influências de jazz, bossa nova, samba e ritmos cubanos, Nova é um grande trabalho que merece a atenção dos fãs de jazz deste século XXI.
“Café com Pão”, a primeira canção do álbum, tem em seu título uma boa analogia para marcar o encontro do entusiasmo pela música brasileira do guitarrista Anthony Wilson com o lirismo e estilo jazzístico do violonista e guitarrista Chico Pinheiro. A faixa é marcada por um tema central tocado com muito balanço e malemolência, que encontra na liberdade de improvisação uma parceria muito boa.
“Tempestade” é uma canção que cresce a partir de um tema central trocado entre o flugelhorn de Daniel D’Alcântara e a guitarra de Wilson para uma melodia mais complexa, onde o piano de Fabio Torres e o dueto de Pinheiro e Wilson constroem juntos um trabalho de beleza e precisão. A canção “Laranjeiras” possui uma agradável melodia intimista, que muito deve ao trabalho de Torres ao piano, mas também aos solos trocados entre o violão de Pinheiro e a guitarra de Wilson, que dão mais vida ao conjunto da obra.
“Cuba” é envolvente com suas variações e o balanço do baixista Paulo Paulelli, o baterista Edu Ribeiro e o pianista Fabio Torres, que contam ainda com bom arranjo de metais e sopros que inclui clarinete, sax alto, sax tenor, sax barítono, flugelhorn e trompete. Pinheiro na guitarra conduz o ritmo, enquanto o grupo todo move-se perfeitamente entre ritmos latinos e o jazz.
Conforme nos indica o título da canção, “Planície”, é retilínea, sem altos e baixos, por onde a melodia flui por uma direção e segue nesse caminho. A sobreposição das notas pelo violão de Pinheiro, pela guitarra de Wilson e pelo violão 7 cordas de Swami Jr. dá uma sensação de preenchimento e estabelece um momento de total integração entre os músicos, ocasionando uma singular fluência. O convidado especial em “When You Dream”, composição de Wayne Shorter, é Ivan Lins acompanhado por um coral de sete vozes entre mulheres e meninas. Mais uma vez a técnica de Pinheiro tocando violão e guitarra se destaca, desta vez em uma faixa com um maior apelo pop, principalmente pelos vocais finais, que se tornam dispensáveis, uma vez que são chatos e atrapalham quando se quer prestar atenção no bom trabalho das guitarras e do piano. Certamente esse é o ponto mais fraco de todo o álbum.
“Easter Monday” é uma prazerosa e breve composição de Wilson, cujo papel é ser uma introdução à canção que dá nome ao álbum, cuja melodia é claramente inspirada em Antonio Carlos Jobim e representa um belo momento de encontro entre bossa nova e jazz como a 50 anos. “Nova” nos dá a oportunidade de ouvir Pinheiro tocando guitarra, enquanto Wilson fica encarregado do violão. Esta canção pode ser ouvida como um dos raros momentos em que o passado pode ser reescrito sem soar fora de moda. Tocada com sutileza e total harmonização entre os diferentes instrumentos, o brilho da canção está na integração e no aprimorado diálogo que há entre guitarra e violão, entre piano, baixo e bateria.O dueto de guitarras “Two Fives” estabelece quase que uma simbiose inicial, que vai se separando em caminhos paralelos constituídos por uma troca, em que um músico cita o outro logo adiante, alternando entre guitarra base e guitarra solo. Embora a musicalidade de Pinheiro pareça surgir com mais naturalidade e beleza, Wilson consegue colocar muito bem o seu estilo, ocasionando uma linda junção de particularidades que refletem na própria música. “Requebre que eu dou um doce” é um samba interpretado pelo cantor Dori Caymmi, filho do compositor Dorival Caymmi, e pelo pianista Cesar Camargo Mariano, ambos como convidados especiais nesta canção que é diferente de tudo gravado nesse álbum. Entretanto, é um grande momento do CD, porque prova a virtuosidade dos músicos que podem unificar ritmos distintos e ainda assim soar muito bem em todos eles.
A naturalidade de “Interlude” é o seu ponto mais forte, pois a canção flui como se todos tivessem decidido tocar apenas para se conhecerem melhor. O piano preciso e melódico de Torres oferece o mote central que vai ganhando a participação do baixo acústico de Paulelli, da bateria de Ribeiro e posteriormente pelo violão de Pinheiro e pela guitarra de Wilson. O resultado é um prazer para os ouvidos.
Encerrando o álbum, “Alla Chitarra” é um brilhante trio de cordas formado por Pinheiro e Wilson nas guitarras e por Swami Jr. no violão 7 cordas. Mais uma vez a sintonia e o diálogo entre as guitarras dá o valor positivo a este trabalho que se mostra não apenas relevante, mas muito respeitável. Técnica e melodia soam de uma maneira singular para produzir um daqueles momentos que o deixam satisfeitos e com a vontade de ouvir todo o álbum mais uma vez.
O resultado dessa parceria entre Chico Pinheiro e Anthony Wilson é muito positivo, pois retoma a integração entre o jazz e a música brasileira com novas composições e não apenas releituras de tradicionais canções já famosas no mundo inteiro. A iniciativa de fazer algo novo é por si só já muito boa, mas alcançando a qualidade demonstrada em Nova, o que se tem é um álbum de grande valor artístico. Felizmente, a divulgação do CD tem sido feita pelos músicos em concertos pelo Brasil e EUA. Entre 2 e 6 de setembro de 2008, Chico Pinheiro e Anthony Wilson apresentam o repertório de Nova em Oakland e Culver City, na Cafifórnia. Mais informações sobre as datas dessas apresentações no site oficial de Chico Pinheiro. Todos os músicos que participaram do álbum:
Chico Pinheiro: violão (1, 2, 3, 5, 6, 7, 10, 11), guitarra (1, 2, 4, 6, 8, 9, 12);
Anthony Wilson: guitarra (1, 2, 3, 5, 6, 7, 9, 10, 11, 12), violão (8);
Fábio Torres: Rhodes (1, 6, 10), piano (2, 3, 4, 6, 7, 8, 11);
Paulo Paulelli: baixo acústico (3, 4, 6, 7, 10, 11);
Marcelo Mariano: baixo elétrico (1, 2, 8);
Edu Ribeiro: bateria (1, 2, 3, 4, 6, 7, 8, 10, 11);
Armando Marçal: percussão (1, 2, 4, 6, 7, 10);
Swami Jr.: violão 7 cordas (5);
Nailor Proveta: clarinete (4), sax alto (4, 10);
Matt Zebley: flauta (8), sax alto (6, 8);
Vinícius Dorin: flauta (4, 10), sax tenor (4, 10), sax barítono (4);
Daniel D’Alcântara: flugelhorn (2, 4, 10), trompete (4);
Paulo Malheiros: trombone (4, 10);
Gilbert Castellanos: trompete (4, 6, 8), flugelhorn (8);
Garrett Smith: trombone (6, 8);
Matt Otto: sax tenor (6, 8);
Adam Schroeder: sax barítono (6, 8)
Ivan Lins: vocal (6);
Luiza Rizzi: vocal (6);
Maria Mariano: vocal (6);
Inez Pinheiro: vocal (6);
Dani Gurgel: vocal (6);
Luciana Alves: vocal (6);
Cida Souza: vocal (6);
Tatiana Parra: vocal (6);
Cesar Camargo Mariano: pads (8); piano (10);
Dori Caymmi: vocal (10);
Luiz Afonso Montanha: clarone (10);
Faixas de Nova:
01. Café com Pão [João Donato/ Lysias Ênio] 06:50
02. Tempestade [Chico Pinheiro/ Chico César] 05:48
03. Laranjeiras [Anthony Wilson] 06:44
04. Cuba [Chico Pinheiro] 06:40
05. Planície [Chico Pinheiro] 06:38
06. When You Dream [Wayne Shorter] 06:28
07. Easter Monday [Anthony Wilson] 01:56
08. Nova [Chico Pinheiro] 05:44
09. Two Fives [Anthony Wilson] 07:36
10. Requebre Que Eu Dou um Doce [Dorival Caymmi] 03:14
11. Interlude [] 02:31
12. Alla Chitarra [Anthony Wilson] 08:46
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