terça-feira, 30 de dezembro de 2008

O piano em turbilhão de Matthew Shipp

Lançado em 2007 pela gravadora Thirsty Ear, Piano Vortex marca 20 anos da primeira gravação do pianista Matthew Shipp como líder. Se anteriormente o uso de efeitos eletrônicos vinha sendo corriqueiro em suas gravações, neste álbum Shipp deixa com que apenas o piano, o baixo e a bateria sejam responsáveis pela sonoridade do grupo. Acompanhado pelo baterista Whit Dickey e pelo baixista Joe Morris (mais conhecido como guitarrista), Shipp apresenta oito composições originais de um jazz vanguardista e desafiador. Para saber alguns dos rumos do jazz neste século XXI é bom manter um olho e dois ouvidos em Matthew Shipp.

A faixa-título, “Piano Vortex”, que abre o álbum, começa com um denso dedilhar de Matthew Shipp acompanhado pelo baixo bem marcado de Joe Morris, que confere bastante sobriedade ao trabalho. A melodia não é nem um pouco linear, uma vez que o piano experimenta diversos tons na construção do som e por vezes, logo após encontrar uma nota mais simples e melodiosa, esta é abandonada por algo mais elaborado. Whit Dickey na bateria e Morris limitam-se ao acompanhamento e por isso mesmo contribuem decisivamente para a identidade densa da canção.

“Key Swing” é a faixa mais acessível do álbum. Tudo parece muito simples nesta canção e talvez esse seja o motivo de tudo funcionar tão bem. O ritmo ditado por Morris e Dickey é fácil de acompanhar, bem como a melodia cheia de balanço puxada por Shipp. Ainda que essa canção seja curta, a melodia pode ficar muito tempo tocando dentro da sua cabeça.

A introdução de Morris usando um arco no baixo em “The New Circumstance” nos prepara para mais uma canção densa, na qual Shipp faz uso de uma técnica lenta e cheia de lacunas, que vai acelerando aos poucos até ganhar forma e dominar por completo a sonoridade do trio. Com precisão Dickey acompanha o piano, reforçando o peso da melodia.

“Nooks and Corners” usa intrincadas notas extraídas do piano de Shipp em um swing frenético que encontra o bop e ocasiona um peculiar andamento à canção.

Em “Sliding Through Space” cada instrumento vai se mostrando aos poucos, como quem quer ganhar o seu espaço e construir uma história. O baixo com arco de Morris e a bateria de Dickey surgem em par ditando um ritmo complexo e, mais uma vez denso. O piano de Shipp, que, inicialmente, parece contribuir para uma desarmonia, depois assume o papel de conduzir uma melodia intensa que contrasta com o ritmo crescente e quase sombrio de Morris e Dickey. Essa é uma ótima amostra de jazz de vanguarda, que poderia muito bem ilustrar uma cena de crescente suspense em algum filme hollywoodiano.

“Quivering with Speed” traz um ritmo acelerado puxado por Dickey e Morris, enquanto Shipp conduz a melodia de modo igualmente rápido, construindo uma peça de difícil acesso que precisa ser ouvida várias vezes para que o papel de cada instrumento seja bem compreendido no contexto da canção. A complexidade e a técnica de Shipp nesta faixa são desafios para o ouvinte.

“Slips Through the Fingers” é uma peça de piano solo, na qual Shipp explora os registros mais baixos de seu instrumento. Esta é uma faixa bem intimista que se revela lentamente a cada nova audição.

A última canção, “To Vitalize”, adiciona swing ao trabalho do trio, uma vez que Dickey e Morris ditam o ritmo cheio de balanço, sobre o qual Shipp constrói a melodia. O resultado é um piano que avança além do swingar e procura outras linguagens para se expressar. Essa é a faixa do álbum em que Shipp mais se aproxima de uma de suas principais influências: Thelonious Monk. Por vezes tocando repetidamente a mesma nota, deixando lacunas ou acelerando a melodia, o pianista demonstra muita técnica e uma ótima capacidade de improvisação, bem como uma integração muito afinada com a seção rítmica, como fica claro no solo final de Morris, no qual piano e baixo conseguem uma ótima integração e se tornam instrumentos complementares e contínuos.


Neste álbum, Matthew Shipp abriu mão de recursos eletrônicos para gravar no conhecido esquema de trio piano-baixo-bateria apenas com composições próprias. Shipp, uma das lideranças do jazz atualmente, mostra com este trabalho a sua grande qualidade como intérprete e compositor em peças complexas com andamentos que desafiam os ouvintes. Piano Vortex é recomendado para quem já tem mais afinidade com o jazz de vanguarda e não espera melodias fáceis para cantarolar ou assoviar.

Todos os músicos que participaram do álbum:
Matthew Shipp: piano;
Joe Morris: baixo (exceto faixa 07);
Whit Dickey: bateria (exceto faixa 07).

Faixas de Piano Vortex:
01. Piano Vortex [Shipp] 10:26
02. Key Swing [Shipp] 3:21
03. The New Circumstance [Shipp] 9:11
04. Nooks and Corners [Shipp] 4:10
05. Sliding Through Space [Shipp] 8:54
06. Quivering with Speed [Shipp] 6:38
07. Slips Through the Fingers [Shipp] 3:17
08. To Vitalize [Shipp] 7:13

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domingo, 26 de outubro de 2008

As vibrações orgânicas de Joey DeFrancesco

O órgão Hammond B3 tocado por Joey DeFrancesco no álbum Organic Vibes, lançado em 2006 pela Concord Jazz, pertenceu ao lendário Jimmy Smith, um dos mentores do líder deste grupo. A idéia de DeFrancesco neste álbum era expandir a sonoridade conjunta do órgão e do vibrafone, por isso o álbum recebeu o título que tem. De acordo com o organista, esse dueto nunca foi muito explorado, mas apresentou bons resultados, portanto essa seria uma boa oportunidade para trabalhar essa sonoridade. O vibrafonista escolhido para o álbum foi o veterano Bobby Hutcherson, que encontrou grande afinidade musical com DeFrancesco. Juntos realizaram um grande álbum e o objetivo do organista certamente foi alcançado.

A faixa inicial do álbum, “The Tackle”, começa com um ritmo swingado, que se desenvolve em uma batida mais bop, na qual destacam-se os solos de vibrafone de Bobby Hutcherson e do sax tenor de Ron Blake. Ao fundo, na condução rítmica está o baterista Byron Landham, o guitarrista Jake Langley e, por vezes, o organista Joey DeFrancesco, até que este direciona o seu Hammond B3 para o primeiro plano e nele executa um solo ágil cheio de balanço. O resultado de tudo isso é um hard bop de primeira qualidade.

Em “Little B’s Poem” a flauta de Blake soando contemplativa, o Hammond B3 de DeFrancesco quase frenético em alguns momentos e o vibrafone de Hutcherson estabelecendo uma ponte dão um refinamento à canção. A perfeita integração entre esses instrumentos é o que faz o sucesso da melodia que a todo momento se mantém bastante progressiva.

“I Thought About You” tem no belo dueto de DeFrancesco e Hutcherson o seu ponto alto. Enquanto Landham conduz o ritmo usando vassourinhas, à frente na condução melódica desta deliciosa balada estão o Hammond B3 e o vibrafone, que travam um diálogo de muita afinidade e transformam a sonoridade sentimental da canção em um casamento feliz entre os dois instrumentos.

“Somewhere in the Night” adiciona o sax tenor do veterano George Coleman ao trio original (DeFrancesco, Hutcherson e Landham), que enriquece o tema central da canção, que se desenvolve e é executado com muita propriedade nos duetos entre o Hammond B3 e o vibrafone. O curto solo de guitarra de Langley acrescenta ainda mais qualidade à melodia e através da ponte feita por DeFrancesco temos acesso a um agradável solo de Coleman, que devolve para o organista a função de conduzir, junto com Landham, a canção.

“Down the Hatch” tem um balanço muito gostoso na melodia, que é em grande parte responsabilidade do sax tenor de Coleman. Landham e DeFrancesco fazem o plano de fundo para que o sopro ganhe destaque inicialmente. Quando o Hammond B3 passa para o primeiro plano, o que se tem é uma demonstração de grande habilidade e um ótimo senso de swing por parte de DeFrancesco.

A versão hard bop de “Speak Low” é surpreendentemente boa. Quem espera uma versão lenta e intimista como de costume também é feita para esse standard também será surpreendido. O ritmo acelerado puxado por Landham é seguido com grande competência por Coleman, que junto a DeFrancesco mudam a cara da canção. Certamente este é um dos pontos altos do álbum, pois os músicos conseguiram fazer desta versão hard bop uma referência de como tocar “Speak Low”.

“Jeneane’s Dream” funciona muito bem com Hutcherson e DeFrancesco tocando a mesma nota em uma harmonia muito bonita que dá os ares iniciais dessa balada. Em seus solos, ambos mantém o alto nível em que a melodia vinha sendo conduzida e acrescentam suas interpretações ao tema central. O resultado é uma canção de fácil e agradável acompanhamento por parte do ouvinte.

O clima intimista de “My Foolish Heart” é perfeito para demonstrar a integração obtida por Hutcherson e DeFrancesco. A tônica da canção é o Hammond B3 fazendo a base para que o vibrafone tome o lugar principal em guiar a melodia, o que Hutcherson realiza com grande propriedade. Toda a motivação sentimental da canção é muito bem captada e expressa nesta versão.

O álbum é fechado com “Colleen”, uma canção que começa com uma clara inspiração na bossa nova. O sax soprano de Blake dá ainda mais suavidade à melodia, que flui com grande leveza, enquanto o ritmo puxado por Landham é bem marcado e até estático. O solo de Langley dá continuidade ao trabalho do soprano colocando a interpretação das seis cordas para o tema central, que ainda é expandido na interpretação de DeFrancesco, que se permite mais liberdade na improvisação.

A idéia de juntar o Hammond B3 que pertenceu a Jimmy Smith e o vibrafone de Bobby Hutcherson funcionou muito bem nesse álbum, que faz de Joey DeFrancesco um dos principais organistas de jazz da atualidade. A maneira como DeFrancesco sabe se colocar nas canções, ora como principal condutor da melodia, ora como mero coadjuvante, explica em grande parte o sucesso na execução do repertório de Organic Vibes, uma vez que ele não se comporta como uma estrela que precisa ser a mais brilhante o tempo todo, mas trabalha na harmonia musical, o que é o ponto forte desse grupo. Altamente recomendável, Organic Vibes deve agradar aos fãs do órgão Hammond B3 e também aos aficionados por vibrafone.

Todos os músicos que participaram do álbum:
Joey DeFrancesco: órgão Hammond B3;
Bobby Hutcherson: vibrafone;
Ron Blake: saxofone tenor, saxofone soprano, flauta (1, 2, 9);
George Coleman: saxofone tenor (4, 5, 6);
Jake Langley: guitarra (1, 4, 9);
Byron Landham: bateria.

Faixas de Organic Vibes:
01. The Tackle [DeFrancesco] 8:09
02. Little B's Poem [Hutcherson] 6:29
03. I Thought About You [Mercer, VanHeusen] 9:26
04. Somewhere in the Night [Reid, Reid] 8:33
05. Down the Hatch [DeFrancesco] 6:51
06. Speak Low [Nash, Nash, Weill] 7:52
07. Jeneane's Dream [Landham] 4:21
08. My Foolish Heart [Washington, Young] 6:06
09. Colleen [DeFrancesco] 6:43

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Veja o vídeo de Joey DeFrancesco e Bobby Hutcherson tocando “Litte B’s Poem”:


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Veja o vídeo de Joey DeFrancesco e Bobby Hutcherson tocando “I Thought About You”:


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Veja o vídeo de Joey DeFrancesco e Bobby Hutcherson tocando “Somewhere in the Night”:

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Veja o vídeo de Joey DeFrancesco tocando “Speak Low”:

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Veja o vídeo de Joey DeFrancesco e Bobby Hutcherson tocando “My Foolish Heart”:

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Veja o vídeo de Joey DeFrancesco e Bobby Hutcherson tocando “Just Friends” (canção não incluída no álbum):




Veja o vídeo de Joey DeFrancesco e Bobby Hutcherson tocando “Take the Coltrane” (canção não incluída no álbum):

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sábado, 11 de outubro de 2008

Você está convidado a adentrar o cinema invisível de Aaron Parks

Lançado em 2008 pela gravadora Blue Note, Invisible Cinema é o primeiro trabalho de Aaron Parks como líder para uma gravadora maior. Conhecido por ser o pianista do grupo do trompetista Terence Blanchard, Parks apresenta dez composições próprias, que fazem referência a um jazz “espontâneo” e “cinemático”, conforme definições do próprio Parks. O talento do pianista e seus duetos viajantes com o guitarrista Mike Moreno são destaques de Invisible Cinema.

“Travelers”, a primeira faixa do álbum, puxa o ouvinte para duas rotas diferentes, porque de um lado o baterista Eric Harland executa uma base de jazz-funk; enquanto, o pianista Aaron Parks toca uma melodia cheia de recursos e que se constrói o tempo todo, que ao final da canção se transforma em uma melodia clássica, tanto que se ouvido separadamente, o solo de Parks é próximo de uma sonata.

A bela melodia de piano de “Peaceful Warrior” é a marca dessa canção por sua suavidade e apurado senso estético. A bateria de Harland e o baixo de Matt Penman conduzem o ritmo para que Parks para solar espontaneamente, o que ele faz com maestria. A melodia introspectiva passa por uma transformação e uma mudança de andamento com a entrada do solo do guitarrista Mike Moreno que adiciona um balanço à canção. O diálogo entre o piano e a guitarra é a tônica da segunda parte da canção. Uma nova mudança de andamento faz a melodia voltar à introspecção, quando Parks, tocando belas notas, conduz a canção para o seu empolgante final. Apenas nessa canção, o pianista já mostra ser cheio de recursos como intérprete e compositor, pois “Peaceful Warrior” é uma bela obra-de-arte.

“Nemesis” se constrói a partir do piano de Parks tocando repetidamente a mesma nota e Moreno fazendo um solo repleto de lacunas. O efeito do piano, do baixo e da bateria é quase hipnótico, pois o ritmo é meticulosamente mantido até que Parks se liberta para solar. Mas é um engano pensar que o piano está realmente liberto, pois Parks volta a marcar o ritmo com uma das mãos e tocar um glockenspiel com a outra; enquanto, Moreno conduz a melodia com um solo viajante à Pat Metheny.

“Riddle Me This” tem um ritmo constante e bem marcado pelo baixo de Penman e a bateria de Harland, enquanto o piano de Parks, acompanhado pela guitarra de Moreno, produz uma melodia que tem um crescendo e que vai envolvendo até acabar bruscamente. Já “Into the Labyrinth” é uma canção solo de Parks, na qual uma atmosfera intimista é preponderante.

A primeira parte de “Karma” contrasta o ritmo balançante de Harland e Penman com a melodia introspectiva de Parks e Moreno. A progressão da canção vai dando mais liberdade ao pianista e ao guitarrista que são responsáveis por belos duetos em uma peça que se caracteriza por sua espontaneidade e por seu estilo viajante, que conduz o ouvinte devido a sua fluidez. Parks e Moreno conseguem um entrosamento muito bom nessa faixa, e o mesmo pode ser dito de Penman e Harland, o que faz o trabalho do quarteto excelente.

“Roadside Distraction” cativa por seu balanço, que incorpora alguns elementos bluesy. Parks e Moreno dialogam bem na construção da melodia, enquanto Penman e Harland de maneira competente fazem o acompanhamento.

“Harvesting Dance” encontra na melodia elegantemente conduzida por Parks a sua força central, que é bem distribuída nas batidas bem marcadas por Harland, no baixo seguro de Penman e, principalmente, nos solos e acompanhamentos de Moreno, que encontra muita liberdade para deixar sua sonoridade fluir. É fácil deixar-se envolver pela canção, porque ela é muito bem construída e os duetos de guitarra e piano são repletos de energia.

A suavidade na condução rítmica de Harland e Penman em “Praise” encontra no piano de Parks, e no acompanhamento de Moreno, uma peça de grande beleza. Trata-se de uma canção em que o piano está em primeiro plano, o que faz de Parks o responsável por uma melodia tão agradável. Apesar de lenta, não é uma balada; apesar de suave, não soa intimista; “Praise” é uma linda canção que cativa.

O álbum encerra com “Afterglow”, uma canção solo de Parks com um tom intimista, na qual ele desenvolve um tema sem nunca se afastar da sua referência inicial.

Já considerado como um dos grandes lançamentos de jazz de 2008, Invisible Cinema, que alcançou a posição 21 no Top Jazz Albums da Billboard, dificilmente deixará de dar alguma premiação ao pianista e compositor Aaron Parks nas tradicionais eleições de melhores do ano. O álbum é consistente e apresenta canções de qualidade, além de mostrar não apenas o talento e a capacidade técnica de Parks, mas traz também um grupo de talentosos músicos que juntos realizam um grande trabalho. Parks é um dos mais promissores pianistas de sua geração e alguém de quem pode-se esperar muita contribuição para o jazz o século XXI.

Todos os músicos que participaram do álbum:
Aaron Parks: piano, mellotron (3), glockenspiel (3), teclado (3, 5, 6, 8);
Mike Moreno: guitarra (2, 3, 4, 6, 7, 8 e 9);
Matt Penman: baixo (1, 2, 3, 4, 6, 7, 8 e 9);
Eric Harland: bateria (1, 2, 3, 4, 6, 7, 8 e 9).

Faixas de Invisible Cinema:
01. Travelers [Parks] 5:34
02. Peaceful Warrior [Parks] 9:39
03. Nemesis [Parks] 6:14
04. Riddle Me This [Parks] 2:43
05. Into the Labyrinth [Parks] 2:53
06. Karma [Parks] 8:06
07. Roadside Distraction [Parks] 2:44
08. Harvesting Dance [Parks] 9:35
09. Praise [Parks] 4:43
10. Afterglow [Parks] 2:45

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Veja o vídeo de Aaron Parks tocando “Travelers”:



Veja o vídeo de Aaron Parks tocando “Peaceful Warrior”:



Veja o vídeo de Aaron Parks tocando “Nemesis”:

domingo, 5 de outubro de 2008

Regina Carter estará com você nesta jornada sentimental

Lançado em 2006, pela gravadora Verve, o álbum I’ll Be Seeing You: A Sentimental Journey é uma homenagem a Grace Louise Carter, a falecida mãe da violinista Regina Carter. O repertório escolhido é composto pelas canções prediletas da mãe dela, a maior parte standards norte-americanos, blues e canções da Swing Era. O clima nostálgico é constante em todo o álbum, o que faz deste CD uma bela oportunidade para apreciar composições de Hart, Rodgers, Ellington e outros com uma ótima qualidade de gravação. Prepare-se para 66 minutos de muito swing.

A primeira faixa do álbum é uma versão post-bop de “Anitra’s Dance”, do compositor pós-romântico norueguês Edvard Grieg, parte da célebre obra Peer Gynt. A apropriação jazzística da canção deu nova vida à obra, pois a adição da seção rítmica com Alvester Garnett na bateria e Matthew Parrish no baixo incorpora mais dinamismo ao conjunto, uma vez que a melodia, conduzida por Regina Carter no violino, Gil Goldstein no acordeom e Xavier Davis no piano, é acelerada e ganha muito em balanço. Destaque para o dueto entre o violino e o clarinete de Paquito D’Rivera, apoiado na seção rítmica, que dá um ritmo dançante à canção, que, naturalmente, não existia na composição original.

“Little Brown Jug”, popularizada com a orquestra de Glenn Miller, retorna, nesta versão, para as suas origens de canção folk. Tocada por um pequeno grupo, a melodia é levada pelo violino de Carter, que em primeiro plano ganha o destaque principal, enquanto o acordeom de Goldstein e o clarinete de D’Rivera complementam o som deixando-o mais robusto. O trio piano, baixo e bateria faz o acompanhamento com muita precisão, ditando o ritmo sem atrair para si o foco principal.

“Bei Mir Bist Du Schön”, uma canção de origem judaica com versos cantados em inglês, popularizada pelas Andrews Sisters nos anos 1930 e depois gravada por Benny Goodman, tem a participação da cantora Dee Dee Bridgewater. A fusão de folk e swing é a tônica da canção, que conta ainda com belos diálogos entre o violino e o clarinete, além de uma interpretação empolgante de Bridgewater com direito a scat singin’.

A beleza de “Sentimental Journey” na interação entre o baixo de Parrish, que conduz o ritmo, mas também dialoga com violino de Carter e o clarinete de D’Rivera. Com uma levada blues, a canção consegue o seu objetivo que é soar sentimental. Os solos de Carter e D’Rivera sofrem mudanças de andamento como que cantando versos de um velho blues, que expressa uma dor interior. Um ponto alto do álbum.

“You Took Advantage of Me” é cantada por Carla Cook, que faz uma bela interpretação. Os demais instrumentos são relegados ao papel de meros acompanhadores, exceto o violino de Carter que ganha mais espaço com um solo cheio de balanço, na parte mais swingada da canção.

“St. Louis Blues”, que ganhou enorme popularidade com Bessie Smith e Louis Armstrong, nesta versão tem seus versos cantados por Cook. Destaque para os solos em seqüência, primeiro de violino de Carter, depois de acordeom de Goldstein e posteriormente de clarinete de D’Rivera. Carregada de sentimento em sua voz, Cook merece elogios por sua interpretação de uma mulher que sofre por seu amado.

“A-Tisket, A-Tasket”, eternizada na voz de Ella Fitzgerald, ganha aqui uma versão instrumental, na qual o violino de Carter puxa a conhecida melodia onde a voz se encaixaria. O baixo de Parrish e a bateria de Garnett dão o caminho certo para os demais instrumentos conduzirem a melodia com muito swing. Destaque para os duetos entre o violino de Carter e o piano de Davis, que encontram o tempo perfeito e fazem um excelente trabalho de complementação.

A composição de Duke Ellington, “Blue Rose”, tem mais uma vez um belo dueto entre violino e piano, mas desta vez com um tom mais reflexivo que aponta uma direção mais intimista e triste.

“This Can’t Be Love”, composta por Rodgers, parte do musical The Boys from Syracuse, é cantada por Bridgewater com uma interpretação cheia de balanço para a letra irônica da canção que diz: “This can’t be love because I fell so well/ no sob. No sorrow, no sight”. O baixo de Parrish responsável pela condução do ritmo interage muito bem com o piano e o violino, fornecendo todo o suporte, uma vez que a bateria não está presente nesta gravação. O scat de Bridgewater se encaixa muito bem nos diálogos com o piano, o baixo e o violino, dando um balanço muito gostoso à canção. Certamente, um dos melhores momentos do álbum.

“How Ruth Felt”, a única composição de Carter para o álbum, é dedicada a Ruth Felt, presidente da organização de artes San Francisco Performances, que foi importante para Regina durante o período em que sua mãe estava doente. A canção é uma balada construída sobre uma bela melodia intercambiada pelo violino de Carter e o piano de Davis, com uma participação destacada da seção rítmica. Há um quê de ternura em toda a canção, que a torna muito bonita.

A balada “There’s a Small Hotel”, outra composição de Hart e Rodgers, cantada por Cook mantém o clima nostálgico como tema central do álbum. A levada é típica da Swing Era, na qual o violino de Carter e o piano de Davis dialogam com muito entrosamento fazendo o acompanhamento à voz de Cook, cuja interpretação agrega sensualidade e sensibilidade à canção.

“I’ll Be Seeing You” é uma canção sentimental de muito sucesso nos anos 1940 com Bing Crosby, que nesta versão puramente instrumental tem a melodia toda centrada no violino de Carter, que é quem dá a direção, enquanto o acordeom de Goldstein e o piano de Davis fazem o acompanhamento que enriquece a obra. Com essa canção, Carter dá um tom de despedida ao álbum e à sua mãe.

Ainda que o violino no jazz não seja uma novidade, pois artistas como Stephane Grappelli, Jean-Luc Ponty entre outros já o utilizaram antes, ainda não é algo usual. Regina Carter consegue fazer do violino um instrumento tão integrado ao jazz quanto um trompete ou um piano, pois sua habilidade para improvisar e swingar são destacadas. I’ll Be Seeing You: A Sentimental Journey é um álbum que funciona porque apresenta releituras de standards em versões cheias de balanço com muita qualidade.

Todos os músicos que participaram do álbum:
Regina Carter: violino;
Xavier Davis: piano (exceto 4);
Matthew Parrish: baixo;
Alvester Garnett: bateria (exceto 4 e 9);
Dee Dee Bridgewater: vocais (3 e 9);
Carla Cook: vocais (5, 6 e 11);
Paquito D'Rivera: clarinete (1, 2, 3, 4 e 6);
Gil Goldstein: acordeom (1, 2, 3, 6 e 12).

Faixas de I’ll Be Seeing You: A Sentimental Journey:
01. Anitra's Dance [Grieg] 2:55
02. Little Brown Jug [Winner] 4:46
03. Bei Mir Bist Du Schön [Cahn, Chaplin, Jacobs, Secunda] 4:43
04. Sentimental Journey [Brown, Green, Homer] 6:07
05. You Took Advantage of Me [Hart, Rodgers] 4:55
06. St. Louis Blues [Handy] 7:09
07. A-Tisket, A-Tasket [Feldman, Fitzgerald] 8:01
08. Blue Rose [Ellington] 2:52
09. This Can't Be Love [Rodgers] 5:15
10. How Ruth Felt [Carter] 5:52
11. There's a Small Hotel [Hart, Rodgers] 5:21
12. I'll Be Seeing You [Fain, Kahal] 5:09

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Veja o vídeo de Regina Carter interpretando “Anitra’s Dance” ao vivo:



Veja o vídeo de Regina Carter interpretando “Blue Rose” ao vivo:

sábado, 27 de setembro de 2008

É a hora de Joe Farnsworth

Joe Farnsworth é um dos bateristas mais requisitados para sessões de gravação de jazz atualmente. Preferido por músicos da velha e da atual geração jazzística, Farnsworth já gravou diversos álbuns como sideman, mas em 2004, a gravadora 441 lançou It’s Prime Time, seu segundo CD como líder. Reunindo velhos parceiros, o baterista conseguiu juntar músicos lendários como Ron Carter, Benny Golson e Harold Mabern com grandes nomes do jazz atual como Eric Alexander e David Hazeltine. A precisão e o apurado senso rítmico chamam a atenção para o estilo de Farnsworth, um conceituado jazzista do século XXI que merece mais atenção por parte dos fãs desse tipo de música.

A primeira faixa do álbum, “Sweet Poppa” abre com Joe Farnsworth puxando o ritmo da canção para a entrada de Harold Mabern ao piano, Ron Carter no baixo e Eric Alexander no sax tenor, que conduz a melodia com sua habitual elegância executando fraseados rápidos e segurando a nota principal, alongando o seu tempo. Destaque para o solo de Mabern muito bem apoiado pela precisão da dupla Farnsworth e Carter. Uma bela demonstração de como tocar um hard bop sem soar datado.

“Old Folks” começa como uma balada introduzida por David Hazeltine ao piano, seguido por Curtis Fuller no trombone, que dá a direção da melodia, enquanto Farnsworth dita o ritmo com suas vassourinhas na caixa, ao lado do sempre preciso Carter, que também encontra espaço para solar. Nesse momento o trio piano-baixo-bateria faz um excelente trabalho, quando Carter passa o solo para Hazeltine e Farnsworth dita o ritmo com o pedal. O que era uma balada inicialmente já ganha aspecto de hard bop com um balanço gostoso. Fuller, por fim, retoma o clima inicial e encerra a canção com um solo introspectivo.

O trio Farnsworth, Carter e Hazeltine abrem a canção com um ritmo swingado e contagiante, que ganha ainda mais qualidade com a adição do trompetista Jim Rotondi, que tocando com lacunas se comunica muito bem com a seção rítmica. Alexander incorpora mais força à melodia e ao mote central da canção. A condução de Farnsworth é exemplar, porque consegue um balanço envolvente. Em sua única composição para o álbum, o baterista ganha destaque amplo, mesmo que apenas na condução, pois nada foi “inventado” para que o seu instrumento se sobressaísse perante os demais. A qualidade de Farnsworth é demonstrada na harmonia do grupo.

Em “Stable Mates”, Farnsworth puxa o ritmo para a entrada dos veteranos Benny Golson no sax tenor, Carter no baixo e Mabern no piano. Esse encontro de gerações rende ao álbum mais de sete minutos de contemplação: primeiro o destaque está em Golson, que indica a direção melódica, depois Mabern sola com seu balanço habitual, posteriormente Farnsworth coloca seu vigor no chimbal com a baqueta esquerda, enquanto o pedal trabalha no bumbo e a baqueta direita passeia pelas demais partes da bateria. A reentrada de Golson no final da canção não diminui a intensidade do baterista, que segue marcando o ritmo com a mesma precisão. No fim, a canção é dos dois.

“Five Spot After Dark” tem o seu tema marcante executado por Golson, que alterna com Fuller a condução da melodia. A passagem de solos de um para o outro dá dinamicidade à canção, que dispõe ainda de uma base sólida sustentada por Farnsworth, Carter e Mabern.

“And So, I Love Again” é uma balada com um tom melancólico, principalmente pelo modo como Golson consegue fazer o seu sax tenor soar introspectivo. Farnsworth faz uso das vassourinhas para marcar o ritmo, enquanto Mabern estabelece algum diálogo com o sax, que permanece o tempo todo em destaque.

“The Third Plane” tem uma levada bossa nova puxada pela seção rítmica e por Alexander, que é enriquecida pelo trompete de Rotondi, que tem liberdade para solar. O solo de Carter, conduzido por Farnsworth, agrega à canção ainda mais balanço, que é estendido por Hazeltine. O tema inicial retoma para encerrar a canção.

Uma versão hard bop de “Hello, Young Lovers” tem início com Farnsworth repercutindo o chimbal e Carter marcando o tempo para Fuller introduzir o trombone na canção e travar um diálogo com o sax tenor de John Farnsworth, irmão do baterista. O trompete de Rotondi é adicionado e estabelece ainda mais dinamismo à faixa por seu soar rápido de cada nota, John Farnsworth desacelera a melodia, embora a seção rítmica siga na corrida. Hazeltine ao solar mantém a melodia no mesmo ritmo. O solo preciso de bateria de Joe Farnsworth é perfeitamente incorporado por Carter, que volta a marcar o tempo inicial da canção, que novamente introduz o trombone de Fuller à melodia e consegue chegar o ciclo, levando a canção de volta ao ponto inicial.

O álbum encerra com “Jose’s Lament”, uma faixa em que Farnsworth e Carter fazem a condução e deixam Alexander e Hazeltine solar com liberdade. O resultado é uma canção despretensiosa que reúne músicos de primeira linha tocando um tema agradável de acompanhar.

Joe Farnsworth conseguiu reunir reunir velhos parceiros, para quem já havia gravado, em seu álbum e apostou em uma seleção musical que juntasse alguns temas novos e standards. O resultado foi o nascimento de um grande álbum com músicos de primeira grandeza.

Todos os músicos que participaram do álbum:
Joe Farnsworth: bateria
Ron Carter: baixo
David Hazeltine: piano (2,3,7,8,9)
Harold Mabern: piano (1,4,5,6)
Eric Alexander: saxofone tenor (1,2,3,7,9)
Benny Golson: saxofone tenor (4,5,6)
Curtis Fuller: trombone (2,5,8)
Jim Rotondi: trompete, flugelhorn (3,7,8)
John Farnsworth: saxofone tenor (8)

Faixas de It’s Prime Time:
01. Sweet Poppa [Mabern] 5:46
02. Old Folks [Hill, Robison] 7:20
03. Prime Time [Farnsworth] 8:02
04. Stable Mates [Golson] 7:11
05. Five Spot After Dark [Golson] 5:50
06. And So, I Love Again [Golson] 4:20
07. The Third Plane [Carter] 5:37
08. Hello, Young Lovers [Hammerstein, Rodgers] 7:44
09. Jose's Lament [Hazeltine] 7:06

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domingo, 21 de setembro de 2008

Wycliffe Gordon quer saber: com o que você está lidando?

O trombonista Wycliffe Gordon tornou-se conhecido no universo do jazz ao ingressar no septeto de Wynton Marsalis e posteriormente no Lincoln Center Jazz Orchestra sob regência do mesmo. Sua carreira como líder deu início na metade da década de 1990, quando ao trazer o trombone – um instrumento comum no jazz do início do século XX, mas que foi perdendo lugar nos pequenos grupos – para a linha de frente da instrumentação jazzística, Gordon foi ganhando mais destaque como intérprete e compositor. Em 2001, através da gravadora Criss Cross, foi lançado o álbum What You Dealin’ With, que reúne standards e composições originais em um programa que junta swing, blues, bebop e hard bop com muita naturalidade.

O álbum inicia com a canção “In a Mellow Tone”, composição de Ellington e Gabler, o que já confere a garantia de swing logo de saída. Destaque para o dueto de trombone e sax tenor proporcionado por Wycliffe Gordon e Herb Harris, que dialogam o mote central da canção. O baixista Zach Pride e o baterista Rodney Green limitam-se ao papel de coadjuvantes sustentando o ritmo para a linha de frente, caracterizada pelos instrumentos de sopro, crescer em solos e duetos cheios de balanço.

O trombone com surdina de Gordon abre “I Remember Al” com uma melodia introspectiva soando como um lamento, que se transforma num blues lento. Pride e Green dão a sustentação para o trombone “chorar”, enquanto sax e trompete aparecem apenas para reforçar o que expressa o líder Gordon com seu instrumento. Uma ótima faixa que reserva diferentes impressões a cada nova ouvida.

“Blue 'n' Boogie” é vibrante tanto pelo ritmo acelerado quanto pela excelente linha de sopros que faz um grande trabalho junto. O trompete de Ryan Kisor é o primeiro a se liberar para solar e é logo acompanhado pelo sax tenor de Harris, que é sucedido pelo trombone de Gordon e por fim o sax soprano de Victor Goines. O final de solo brusco do soprano dá a oportunidade de Green descer as baquetas nos bumbos e pratos até que todos os músicos retomam o tema inicial da canção. É o bebop soando vivo no século XXI.

O scat singin’ de Gordon é a marca de “Cotton Tail”.Enquanto o baixo de Pride e a bateria de Green estabelecem um ritmo lento para a canção, Gordon se liberta na improvisação vocal, encontrando na parceria com o sax soprano de Goines um complementação para a sua criatividade.

O belo diálogo entre a linha de sopros e o baixo é a marca de “Stevie”, composição de Duke Ellington cheia de balanço que consegue combinar muito bem todos os elementos do sexteto. O diálogo inicia torna-se uma conferência muito interessante, da qual participam o sax tenor, o trombone e o trompete dando continuidade ao swing inicial, que incendeia quando Gordon faz a ponte que liga a composição de Ellington com “Mr. PC”, de John Coltrane. O que se ouve é Green e Pride trabalhando intensamente para conduzir o ritmo com dinamismo, enquanto os sopros levam a melodia com liberdade para solar, primeiro com o trompete de Kisor, depois com o sax tenor Harris e o trombone de Gordon. O encontro de todos para tocar o mesmo tema encerra um dos pontos altos do álbum.

“Pretty Little Girl” retoma o clima mais intimista nesta composição de Gordon. Sax tenor e trombone fazem o dueto que conduz a prazerosa melodia. A beleza da canção está no equilíbrio de forças entre os instrumentos, que são muito bem sustentados pelo destacado Pride no baixo.

A versão de “Mood Indigo” de Gordon começa com um solo de trombone, que introduz a estruturação de blues à canção que é seguida à risca pelo baixo de Pride, que é quem conduz o ritmo para que os instrumentos de sopro possam expressar os seus lamentos. Percebe-se que os músicos conseguiram capturar o espírito da canção nessa gravação e traduziram em notas toda a melancolia desse velho blues.

“Cherokee”, outro standard jazzístico presente no álbum, ganha destaque por sua interpretação vigorosa pela seção rítmica e pela execução enérgica da linha de frente de sopros. Os duetos de trombone e trompete, de sax tenor e sax soprano, e o final com a integração dos quatro sopros são os pontos altos desta gravação.

“Bone Abstractions” começa como um blues puxado pelo trombone de Gordon. Depois desse início era de se esperar que os demais instrumentos entrassem na canção, mas a surpresa está no fato de a melodia se estender como uma improvisação solo. Nessa faixa, o líder do grupo demonstra suas habilidades e mostra como swingar desacompanhado.

Com “What You Dealin’ With”, canção que dá nome ao CD, o álbum encerra com uma questão de Gordon em forma de jazz e hip-hop. Com o que você está lidando? Com um balanço contagiante, com uma linha de sopros que consegue dialogar com a batida repetitiva do hip-hop e com as levadas e quebradas do jazz. Fazendo as vezes de vocalista e trombonista nesta faixa, Gordon conseguiu construir um tema central com cara de big band para o seu quarteto de sopros, que parece se multiplicar. Nesta fusão de jazz com hip-hop, em que muitos bons compositores erraram a mão, Gordon conseguiu acertar no alvo certo.

Os fãs de jazz que se sentiam órfãos de um bom trombonista têm em Wycliffe Gordon um bom nome a seguir. Unindo composições próprias com canções consagradas, Gordon consegue fazer a ligação entre o passado e o presente do jazz.

Todos os músicos que participaram do álbum:
Wycliffe Gordon: trombone, vocal
Ryan Kisor: trompete
Victor Goines: saxofone tenor, saxofone soprano
Herb Harris: saxofone tenor
Zach Pride: baixo
Rodney Green: bateria

Faixas de What You Dealin’ With:
01. In a Mellow Tone [Ellington, Gabler] 6:46
02. I Remember Al [Gordon] 4:18
03. Blue 'n' Boogie [Gillespie, Paparelli] 5:14
04. Cotton Tail [Ellington] 4:47
05. Stevie/Mr. P.C. [Ellington/Coltrane] 7:36
06. Pretty Little Girl [Gordon] 8:28
07. Mood Indigo [Bigard, Ellington, Mills] 7:49
08. Cherokee [Noble] 6:28
09. Bone Abstractions [Gordon] 4:01
10. What You Dealin' With [Gordon] 6:40

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terça-feira, 16 de setembro de 2008

A vida noturna em Tóquio segundo Eric Alexander

Em 2003 a gravadora Milestone lançou o álbum Nightlife in Tokyo do saxofonista tenor Eric Alexander. Inicialmente conhecido por ter conquistado o segundo lugar na competição de sax do Thelonious Monk Institute em 1991, atrás apenas de Joshua Redman, Alexander se firma hoje como uma importante figura do jazz atual. Sem ser um vanguardista, seu estilo consegue aliar classe e força em um hard bop de primeira qualidade. Nightlife in Tokyo, gravado em estúdio, apesar do título poder indicar um registro ao vivo, é essencial para quem quer ir além dos grandes titãs que construíram a imagem – e o som – do jazz.

Os belos fraseados do sax tenor Eric Alexander na faixa de abertura, “Nemesis”, são marcas de qualidade na canção, que conta com uma seção rítmica muito bem entrosada composta pelo lendário baixista Ron Carter, pelo baterista Joe Farnsworth e pelo também lendário pianista Harold Mabern. Esse trio dá todo o suporte para Alexander mostrar o porquê de ser um músico tão aclamado por público e crítica atualmente. Seu hard bop que remete a boas lembranças de saxofonistas do passado (um quê de Dexter Gordon), tem energia própria e consegue a difícil missão de juntar muito vigor com lirismo. Essa canção nasceu com vocação para se tornar um standard do século XXI.

A interpretação de um standard jazzístico como “I Can Dream, Can't I?” reitera o lado lírico e melodioso de Alexander. O belo entrosamento do quarteto mais uma vez se sobressai. Destaque para o belo diálogo entre o baixo de Carter que sola com o acompanhamento do piano de Mabern para depois inverter a posição, quando Carter faz a base para o solo de Mabern. Alexander fica responsável por fazer a ligação entre as duas pontas da melodia ao retomar o tema central ao término da canção.

“Nightlife in Tokyo”, a faixa que dá nome ao álbum, mostra dinamismo através da condução mais acelerada de Farnsworth e Carter, enquanto Alexander tem liberdade para solar. O piano de Mabern que vinha servindo de apoio passa ao primeiro plano para retomar o fraseado principal e propor outros em uma execução de muita competência. Um dos méritos do saxofonista é conseguir “grudar” o tema principal da canção na cabeça do ouvinte, pois esse motivo é sempre retomado durante a canção entre os solos.

“I'll Be Around”, balada composta por Alec Wilder, ganha uma bela interpretação pelo quarteto. Definitivamente, essa é uma faixa gravada para o líder brilhar, pois Carter e Farnsworth conduzem o ritmo, Mabern acompanha com um característico espaçamento, enquanto Alexander assume a frente na melodia por boa parte da canção, cedendo esse espaço por pouco tempo para o piano.

A peculiaridade de “Cold Smoke” é que ela inicia com um motivo que parece encerrar a canção, como se o ouvinte chegasse com o trabalho já em andamento. Então, a canção revive puxada por Farnsworth, que logo é acompanhado por Mabern e Carter, que sustentam a base para o solado de Alexander. O piano também recebe um belo destaque com a classe de Mabern em seu solo. O que se tem no geral é um belo exemplo de hard bop bem executado, que alia impetuosidade e técnica. A canção flui tão naturalmente que parece uma jam session, na qual cada músico soa tão espontâneo, que esse material parece ter surgido no momento da gravação.

“Island” é uma boa canção apesar de sua simplicidade. O ritmo inicial com sua levada de fácil acompanhamento propicia o desenvolvimento do solo limpo e swingado de Mabern e do solo de Alexander, que alterna fraseados curtos e longos com vários espaçamentos.

Composta por Eric Alexander em homenagem ao baixista Ron Carter, o quarteto interpreta “Big R. C.” com uma levada ótima cheia de balanço e uma cara de década de 1950. O ritmo post-bop envolvente propiciado por Farnsworth e Carter em diálogo com o piano de Mabern é o destaque da canção, que conta ainda com um solo refinado e melodioso de Alexander, que remete àquela ternura por vezes só encontrada em Dexter Gordon ou Lester Young. Com certeza é um dos pontos altos do álbum.

A canção que encerra o álbum, “Lock Up and Bow Out”, retoma o frenesi encontrado em outros momentos do CD, e, assim como “Cold Smoke”, parece uma jam session fruto de criação espontânea. A liberdade dos músicos do quarteto está declarada e eles estão dispostos a improvisar sem perder a coesão.

Eric Alexander é um grande saxofonista tenor mais propício ao hard bop que conta com um refinado senso de melodia. Ele sabe até onde levar o som de seu sax sem incorrer em exageros, que o fariam mais parecer como um imitador de grandes instrumentistas do passado; no entanto, ele consegue ter voz própria. Acompanhado por ótimos músicos, Alexander mostra seu valor em Nightlife in Tokyo não apenas como saxofonista, mas também como compositor, pois seu trabalho é consistente e de grande qualidade. Esse álbum é obrigatório para quem quer ficar interado com o que de melhor ocorre no jazz do século XXI.

Todos os músicos que participaram do álbum:
Eric Alexander: saxofone tenor
Harold Mabern: piano
Ron Carter: baixo
Joe Farnsworth: bateria

Faixas de Nightlife in Tokyo:
01. Nemesis [Alexander] 8:00
02. I Can Dream, Can't I? [Fain, Kahal] 7:59
03. Nightlife in Tokyo [Mabern] 6:36
04. I'll Be Around [Wilder] 7:59
05. Cold Smoke [Alexander] 8:25
06. Island [Alexander] 7:40
07. Big R.C. [Alexander] 6:17
08. Lock Up and Bow Out [Alexander] 5:32

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domingo, 7 de setembro de 2008

Bojan Z apresenta a sua Xenophonia

O pianista e agora xenofonista franco-sérvio Bojan Z, também conhecido como Bojan Zulfikarpašić, lançou em 2006 o álbum Xenophonia pela gravadora Label Bleu, que se aproxima muito de ser uma obra-prima, se é que efetivamente não é. Deixemos o tempo decidir. Esse CD marca a estréia de mais um instrumento ao jazz: o xenofone, uma invenção do próprio Bojan Z que modificou um Fender Rhodes e conseguiu extrair dele um som diferente do que se imagina para um instrumento de teclas. Mais detalhes na resenha abaixo. Não deixe de ouvir esse álbum e surpreenda-se com um trio (às vezes quarteto) espetacular.

Bojan Z se apresenta em São Paulo, no SESC Pinheiros (Teatro Paulo Autran), no próximo dia 12 de setembro às 21 horas. Maiores informações no site do SESC.

O som extraído dos bumbos pelo baterista Ben Perowsky em “Ulaz”, a melodia esparsa do kaval (um tipo de flauta usada por pastores sérvios) de Krassen Lutzkanov e o dedilhado mínimo do baixista Remi Vignolo criam uma atmosfera folk à canção, que serve de contraponto ao piano cheio de lacunas de Bojan Z em uma canção com cara de total experiência musical. Cada músico parece seguir um caminho diferente até a demarcação de um ponto de reencontro. A melodia densa se deve à execução lenta e ao som grave e destacado do baixo que será confrontado com o som estridente do xenofone ao final da canção. Aguarde, pois essa é apenas a primeira amostra da invenção de Bojan Z.


“Zeven” é uma canção com uma melodia muito bonita e bem executada por Bojan Z ao piano, enquanto o baterista Ari Hoenig e o preciso baixista Vignolo levam a seção rítmica com muito vigor. O encaixe do trio é perfeito. Ao ouvir essa canção fica evidente que todos os instrumentos são destacados em um hard bop de muita qualidade.

O que se houve logo no início de “Wheels” é o referido xenofone, uma invenção de Bojan Z, que modificou um Fender Rhodes e o fez soar como uma guitarra com bastante distorção. A base rítmica de blues de Hoenig e Vignolo entra muito bem na canção e dá uma sustentação sólida ao xenofone em um fusion incapaz de deixá-lo indiferente. Mesmo quando troca o xenofone pelo Rhodes, a canção mantém sua base pesada e sua linha experimental. Com certeza essa é uma grande canção que o fará amar o lado inventivo e ousado de Bojan Z ou fará odiá-lo por não seguir a estrutura jazzística tradicional. Coloquem seus ouvidos nessa prova.


“Biggus D” mostra o lado versátil de Bojan Z alternando piano e Rhodes e por vezes tocando ambos ao mesmo tempo. A canção é marcada por uma melodia que se desenvolve, mas de repente é quebrada e o que se tem é um hard bop que chega ao free jazz e decide voltar em uma retomada à melodia central.

A composição de David Bowie, “Ashes to Ashes”, tem em sua base pop um tema bem simples que nãoliberdade a Hoenig para improvisar, mas ao menos consegue fazer com que Bojan Z consiga executar bons solos ao piano e xenofone.


“Pendant Ce Temps, Chez le Général...” é um free jazz queoportunidade a todos os músicos, cada um a seu tempo, desenvolver um tema, enquanto os demais dão a sustentação rítmica e melódica para as improvisações. O que se tem nesta canção é uma colagem de sons que não encontra uma trilha a seguir, porém mesmo em caminhos diferentes, as notas acabam se encontrando. Experimentação musical total.

“Xenox Bluesusa o recurso de voz sampleada de Alan Lomax, originalmente gravada paraNegro Prison Blues & Songs”, além do xenofone, que soa bastante diferente do som de guitarra tradicional do blues, mas que combinado ao baixo de Vignolo e à bateria de Perowsky dá um toque diferente ao estilo, apesar de a melodia não soar diferente do que se espera de um blues.


As belas notas de piano que iniciam “The Mohican and the Great Spirit”, composição de Horace Silver para o álbum Silver ‘n Percussion de 1977, dão ao ouvinte a certeza de uma melodia muito bonita. Os acréscimos de Vignolo e Hoenig trazem mais qualidade à canção, enquanto Bojan Z oferece muita sutileza em um tema de grande qualidade. A suavidade que o pianista consegue colocar na melodia demonstra não apenas o seu talento e a sua habilidade, mas a sensibilidade necessária para transformar notas musicais em arte. Silver deve ter ficado orgulhoso deste trabalho.

“CD-Rom” é caótica! O kaval de Lutzkanov, o baixo de Vignolo, a bateria de Perowsky e o piano de Bojan Z têm pressa. Ritmo e melodia rápidos dão o sentido exato do que o compositor quis dizer com o título dessa faixa, na qual a velocidade é constante como é a tecnologia. Não sei se “CD-Rom” foi gravada a 512mbps, 1Gbps ou 2 Gbps, mas todos os instrumentos se encaixam perfeitamente e o resultado é um hard bop ousado de tirar o fôlego.


O álbum encerra com “Izlas”, uma canção que contrapõe Hoenig e Bojan Z, pois a bateria adota um caminho, enquanto o piano segue outra direção. Para segurar os dois, está Vignolo fazendo o papel de contra-peso nessa balança.

O álbum Xenophonia é empolgante e impressiona pela simbiose que Bojan Z, Vignolo e ora Hoenig, ora Perowsky conseguem criar. Vencedor do prêmio “Les Victoires du Jazz 2007” como melhor CD francês do ano, essa obra tem um valor musical muito grande. Como compositor e instrumentista, Bojan Z se mostra como um artista de grande talento, ousadia e importância para o jazz do século XXI. Esse CD é muito bom, não deixem de ouvi-lo.


Todos os músicos que participaram do álbum:

Bojan Z: piano, Fender Rhodes, xenofone

Remi Vignolo: baixo acústico

Ari Hoenig: bateria (2, 3, 4, 8, 10)

Ben Perowsky: bateria (1, 5, 6, 7, 9)

Krassen Lutzkanov: kaval (1, 9)


Faixas de Xenophonia:

01. Ulaz [Bojan Z] 7:21

02. Zeven [Bojan Z] 5:55

03. Wheels [Bojan Z, R.M.Tocak] 9:06

04. Biggus D [Bojan Z] 7:20

05. Ashes to Ashes [David Bowie] 4:50

06. Pendant Ce Temps, Chez le Général... [Bojan Z, Remi Vignolo, Ben Perowsky] 4:25

07. Xenox Blues [Bojan Z] 7:13

08. The Mohican and the Great Spirit [Horace Silver] 6:21

09. CD-Rom [Bojan Z] 5:01

10. Izlas [Bojan Z, Ari Hoenig] 2:35


Ouça algumas faixas deste e de outros álbuns no My Space.

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Veja o vídeo de Bojan Z tocando “Ashes to Ashes”: