O pianista e agora xenofonista franco-sérvio Bojan Z, tambémconhecidocomo Bojan Zulfikarpašić, lançou em 2006 o álbumXenophoniapela gravadora Label Bleu, que se aproxima muito de ser uma obra-prima, se é queefetivamentenão é. Deixemos o tempodecidir. Esse CD marca a estréia de maisuminstrumento ao jazz: o xenofone, uma invenção do próprio Bojan Z que modificou umFender Rhodes e conseguiu extrair dele umsomdiferente do que se imagina parauminstrumento de teclas. Maisdetalhes na resenhaabaixo. Não deixe de ouviresseálbum e surpreenda-se comumtrio (às vezesquarteto) espetacular.
Bojan Z se apresenta emSão Paulo, no SESC Pinheiros (Teatro Paulo Autran), no próximodia 12 de setembro às 21 horas. Maioresinformações no site do SESC.
O som extraído dos bumbospelobaterista Ben Perowsky em “Ulaz”, a melodiaesparsa do kaval (umtipo de flauta usada porpastores sérvios) de Krassen Lutzkanov e o dedilhado mínimo do baixista Remi Vignolo criam uma atmosfera folk à canção, que serve de contraponto ao pianocheio de lacunas de Bojan Z em uma cançãocomcara de totalexperiência musical. Cadamúsico parece seguirumcaminhodiferenteaté a demarcação de umponto de reencontro. A melodiadensa se deve à execuçãolenta e ao somgrave e destacado do baixoque será confrontado com o somestridente do xenofone ao final da canção. Aguarde, pois essa é apenas a primeiraamostra da invenção de Bojan Z.
“Zeven” é uma cançãocom uma melodiamuitobonita e bem executada por Bojan Z ao piano, enquanto o baterista Ari Hoenig e o precisobaixista Vignolo levam a seção rítmica commuitovigor. O encaixe do trio é perfeito. Ao ouvir essa canção fica evidentequetodos os instrumentossãodestacadosemum hard bop de muitaqualidade.
O que se houve logo no início de “Wheels” é o referido xenofone, uma invenção de Bojan Z, que modificou umFender Rhodes e o fez soarcomo uma guitarracombastantedistorção. A base rítmica de blues de Hoenig e Vignolo entra muitobem na canção e dá uma sustentaçãosólida ao xenofone emum fusion incapaz de deixá-lo indiferente. Mesmoquandotroca o xenofone pelo Rhodes, a canção mantém suabasepesada e sualinha experimental. Comcerteza essa é uma grandecançãoque o fará amar o ladoinventivo e ousado de Bojan Z ou fará odiá-lo pornãoseguir a estrutura jazzística tradicional. Coloquem seusouvidos nessa prova.
“Biggus D” mostra o ladoversátil de Bojan Z alternando piano e Rhodes e porvezes tocando ambos ao mesmotempo. A canção é marcada por uma melodiaque se desenvolve, mas de repente é quebrada e o que se tem é um hard bop quechega ao free jazz e decide voltarem uma retomada à melodiacentral.
A composição de David Bowie, “Ashes to Ashes”, tem emsuabase pop umtemabemsimplesquenão dá liberdade a Hoenig paraimprovisar, mas ao menos consegue fazercomque Bojan Z consigaexecutarbonssolos ao piano e xenofone.
“Pendant Ce Temps, Chez le Général...” é um free jazz que dá oportunidade a todos os músicos, cadaum a seutempo, desenvolverumtema, enquanto os demais dão a sustentação rítmica e melódica para as improvisações. O que se tem nesta canção é uma colagem de sonsquenãoencontra uma trilha a seguir, porémmesmoemcaminhosdiferentes, as notas acabam se encontrando. Experimentação musical total.
“Xenox Blues” usa o recurso de voz sampleada de Alan Lomax, originalmente gravada para “Negro Prison Blues & Songs”, além do xenofone, que soa bastantediferente do som de guitarra tradicional do blues, masque combinado ao baixo de Vignolo e à bateria de Perowsky dá umtoquediferente ao estilo, apesar de a melodianãosoardiferente do que se espera de umblues.
As belas notas de pianoque iniciam “The Mohican and the Great Spirit”, composição de Horace Silver para o álbumSilver ‘n Percussion de 1977, já dão ao ouvinte a certeza de uma melodiamuitobonita. Os acréscimos de Vignolo e Hoenig trazem maisqualidade à canção, enquanto Bojan Z oferece muitasutilezaemumtema de grandequalidade. A suavidadeque o pianista consegue colocar na melodia demonstra nãoapenas o seutalento e a suahabilidade, mas a sensibilidadenecessáriaparatransformarnotas musicais emarte. Silver deve ter ficado orgulhoso deste trabalho.
“CD-Rom” é caótica! O kaval de Lutzkanov, o baixo de Vignolo, a bateria de Perowsky e o piano de Bojan Z têm pressa. Ritmo e melodiarápidos dão o sentidoexato do que o compositor quis dizercom o título dessa faixa, na qual a velocidade é constantecomo é a tecnologia. Não sei se “CD-Rom” foi gravada a 512mbps, 1Gbps ou 2 Gbps, mastodos os instrumentos se encaixam perfeitamente e o resultado é um hard bop ousado de tirar o fôlego.
O álbumencerracom “Izlas”, uma cançãoque contrapõe Hoenig e Bojan Z, pois a bateria adota umcaminho, enquanto o piano segue outradireção. Parasegurar os dois, lá está Vignolo fazendo o papel de contra-peso nessa balança.
O álbumXenophonia é empolgante e impressiona pelasimbioseque Bojan Z, Vignolo e ora Hoenig, ora Perowsky conseguem criar. Vencedor do prêmio “Les Victoires du Jazz 2007” comomelhor CD francês do ano, essa obra tem umvalor musical muitogrande. Comocompositor e instrumentista, Bojan Z se mostracomoumartista de grandetalento, ousadia e importânciapara o jazz do século XXI. Esse CD é muitobom, não deixem de ouvi-lo.
Todos os músicosque participaram do álbum:
Bojan Z: piano, Fender Rhodes, xenofone
Remi Vignolo: baixoacústico
Ari Hoenig: bateria (2, 3, 4, 8, 10)
Ben Perowsky: bateria (1, 5, 6, 7, 9)
Krassen Lutzkanov: kaval (1, 9)
Faixas de Xenophonia:
01. Ulaz [Bojan Z] 7:21
02. Zeven [Bojan Z] 5:55
03. Wheels [Bojan Z, R.M.Tocak] 9:06
04. Biggus D [Bojan Z] 7:20
05. Ashes to Ashes [David Bowie] 4:50
06. Pendant Ce Temps, Chez le Général... [Bojan Z, Remi Vignolo, Ben Perowsky] 4:25
07. Xenox Blues [Bojan Z] 7:13
08. The Mohican and the Great Spirit [Horace Silver] 6:21
Natural de Porto Alegre, estou desde 2005 em Florianópolis. Cursei Licenciatura em Letras (Inglês/Português) por quatro anos na UFRGS. Foi nessa época que surgiu o meu interesse por jazz. Posteriormente abandonei o curso para ingressar na faculdade de Psicologia na UFSC. Meu amor pela música é intenso, bem como minha curiosidade pelo novo. Depois de muito ouvir "dinossauros" como Mingus, Coltrane, Miles, Parker, Monk e outros, quis descobrir novos talentos. São algumas dessas descobertas que compartilho neste blog.
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