terça-feira, 30 de dezembro de 2008

O piano em turbilhão de Matthew Shipp

Lançado em 2007 pela gravadora Thirsty Ear, Piano Vortex marca 20 anos da primeira gravação do pianista Matthew Shipp como líder. Se anteriormente o uso de efeitos eletrônicos vinha sendo corriqueiro em suas gravações, neste álbum Shipp deixa com que apenas o piano, o baixo e a bateria sejam responsáveis pela sonoridade do grupo. Acompanhado pelo baterista Whit Dickey e pelo baixista Joe Morris (mais conhecido como guitarrista), Shipp apresenta oito composições originais de um jazz vanguardista e desafiador. Para saber alguns dos rumos do jazz neste século XXI é bom manter um olho e dois ouvidos em Matthew Shipp.

A faixa-título, “Piano Vortex”, que abre o álbum, começa com um denso dedilhar de Matthew Shipp acompanhado pelo baixo bem marcado de Joe Morris, que confere bastante sobriedade ao trabalho. A melodia não é nem um pouco linear, uma vez que o piano experimenta diversos tons na construção do som e por vezes, logo após encontrar uma nota mais simples e melodiosa, esta é abandonada por algo mais elaborado. Whit Dickey na bateria e Morris limitam-se ao acompanhamento e por isso mesmo contribuem decisivamente para a identidade densa da canção.

“Key Swing” é a faixa mais acessível do álbum. Tudo parece muito simples nesta canção e talvez esse seja o motivo de tudo funcionar tão bem. O ritmo ditado por Morris e Dickey é fácil de acompanhar, bem como a melodia cheia de balanço puxada por Shipp. Ainda que essa canção seja curta, a melodia pode ficar muito tempo tocando dentro da sua cabeça.

A introdução de Morris usando um arco no baixo em “The New Circumstance” nos prepara para mais uma canção densa, na qual Shipp faz uso de uma técnica lenta e cheia de lacunas, que vai acelerando aos poucos até ganhar forma e dominar por completo a sonoridade do trio. Com precisão Dickey acompanha o piano, reforçando o peso da melodia.

“Nooks and Corners” usa intrincadas notas extraídas do piano de Shipp em um swing frenético que encontra o bop e ocasiona um peculiar andamento à canção.

Em “Sliding Through Space” cada instrumento vai se mostrando aos poucos, como quem quer ganhar o seu espaço e construir uma história. O baixo com arco de Morris e a bateria de Dickey surgem em par ditando um ritmo complexo e, mais uma vez denso. O piano de Shipp, que, inicialmente, parece contribuir para uma desarmonia, depois assume o papel de conduzir uma melodia intensa que contrasta com o ritmo crescente e quase sombrio de Morris e Dickey. Essa é uma ótima amostra de jazz de vanguarda, que poderia muito bem ilustrar uma cena de crescente suspense em algum filme hollywoodiano.

“Quivering with Speed” traz um ritmo acelerado puxado por Dickey e Morris, enquanto Shipp conduz a melodia de modo igualmente rápido, construindo uma peça de difícil acesso que precisa ser ouvida várias vezes para que o papel de cada instrumento seja bem compreendido no contexto da canção. A complexidade e a técnica de Shipp nesta faixa são desafios para o ouvinte.

“Slips Through the Fingers” é uma peça de piano solo, na qual Shipp explora os registros mais baixos de seu instrumento. Esta é uma faixa bem intimista que se revela lentamente a cada nova audição.

A última canção, “To Vitalize”, adiciona swing ao trabalho do trio, uma vez que Dickey e Morris ditam o ritmo cheio de balanço, sobre o qual Shipp constrói a melodia. O resultado é um piano que avança além do swingar e procura outras linguagens para se expressar. Essa é a faixa do álbum em que Shipp mais se aproxima de uma de suas principais influências: Thelonious Monk. Por vezes tocando repetidamente a mesma nota, deixando lacunas ou acelerando a melodia, o pianista demonstra muita técnica e uma ótima capacidade de improvisação, bem como uma integração muito afinada com a seção rítmica, como fica claro no solo final de Morris, no qual piano e baixo conseguem uma ótima integração e se tornam instrumentos complementares e contínuos.


Neste álbum, Matthew Shipp abriu mão de recursos eletrônicos para gravar no conhecido esquema de trio piano-baixo-bateria apenas com composições próprias. Shipp, uma das lideranças do jazz atualmente, mostra com este trabalho a sua grande qualidade como intérprete e compositor em peças complexas com andamentos que desafiam os ouvintes. Piano Vortex é recomendado para quem já tem mais afinidade com o jazz de vanguarda e não espera melodias fáceis para cantarolar ou assoviar.

Todos os músicos que participaram do álbum:
Matthew Shipp: piano;
Joe Morris: baixo (exceto faixa 07);
Whit Dickey: bateria (exceto faixa 07).

Faixas de Piano Vortex:
01. Piano Vortex [Shipp] 10:26
02. Key Swing [Shipp] 3:21
03. The New Circumstance [Shipp] 9:11
04. Nooks and Corners [Shipp] 4:10
05. Sliding Through Space [Shipp] 8:54
06. Quivering with Speed [Shipp] 6:38
07. Slips Through the Fingers [Shipp] 3:17
08. To Vitalize [Shipp] 7:13

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