quarta-feira, 30 de julho de 2008

Uma noite com Eldar no Blue Note.

Considerado uma das mais promissoras figuras do jazz atual, Eldar Djangirov, um jovem pianista nascido no Quirguistão, gravou Live at the Blue Note entre 11 e 14 de outubro de 2005, no tradicional Jazz Club de Nova York, quando tinha apenas 18 anos de idade. Lançado pela gravadora Sony Classical em 2006, o álbum chamou logo a atenção por se tratar de um prodígio ao piano que foi comparado pela imprensa especializada a Art Tatum e Oscar Peterson.

A primeira faixa do álbum é uma das composições mais conhecidas de Cole Porter: “What Is This Thing Called Love”. A velocidade de Eldar ao piano impressiona, enquanto o baixista Marco Panascia e o baterista Todd Strait precisam se esforçar para acompanhar. Rápido como uma paixão adolescente, o ritmo desse arranjo deixa uma pergunta para ser respondida nas próximas faixas do CD: além de sua técnica invejável, o que mais Eldar pode mostrar?

“Someday” é um lindo dedilhar sobre as teclas do piano e uma melodia deliciosa. Eldar imprime uma sonoridade limpa e clara ao seu piano, tornando-o de fácil apreciação para o público.

O trompetista Chris Botti se junta ao trio para uma participação especial na faixa “You Don’t Know What Love Is”, de DePaul e Raye. A melodia à Chet Baker de Botti encontra perfeito par na sutileza de Eldar ao piano. Uma ótima balada que marca um dos pontos altos do álbum.

“Daily Living” é agradável, apesar de um tanto previsível. Nenhum dos músicos se arrisca nesta canção, tanto que o destaque total se destina à habilidade e velocidade do pianista, porque Strait e Panascia fazem apenas o acompanhamento rítmico.

“Dat Dere” é muito bem construída sobre a marcação de tempo de Strait e Panascia, queum entrosamento maravilhoso, enquanto Eldar dedilha elegantemente as teclas de seupiano extraindo uma melodia precisamente linda com muito balanço. alcançam

Ao tocar a canção mais lenta do set-list, “Besame Mucho”, Eldar traz à tona a sentimentalidade gravada nesta melodia de Skylar e Velázquez. Muito preciso em suas notas, o pianista também se sai bem em suas improvisações, mostrando que suas habilidades musicais vão muito além de desafiar os limites de velocidade que seus dedos alcançam ao piano.

Para tocar um clássico de Monk, o trio recebe no palco o trompetista Roy Hargrove e juntos executam “Straight, No Chaser”. Os estilos de Monk e Eldar são bem diferentes, pois enquanto o primeiro tinha um balanço natural e gostava das lacunas deixadas na música, o segundo é mais cerebral e busca preencher cada espaço com notas rápidas. Qual o resultado dessa versão? Ficou ótima, pois Eldar leva seu solo a uma grande velocidade e seu dueto com Hargrove é um delicioso contraponto entre ambos os músicos. Muita energia e intensidade em outro ponto alto do álbum.

Opondo-se ao clima criado anteriormente, “Sincerely” é quase uma sonata, na qual Eldar solo ao piano faz um lindo trabalho. “Chronicle” é uma canção rápida com uma boa interação entre o trio. O balanço demonstrado nesta canção mostra o potencial dos músicos em explorar diferentes caminhos, o que é muito positivo. Este é o momento de mais swing de Eldar, Panascia e Strait durante essa apresentação no Blue Note.

Para encerrar a noite, Eldar escolheu uma das canções mais conhecidas da história do jazz, “Take the “A” Train”, de Strayhorn. Se Duke Ellington levou muita gente a dançar com essa canção, Eldar a transforma em um desafio para a sua própria velocidade. Um exibicionismo? Sim. Ninguém duvida da habilidade dele como pianista e a maneira como as notas são rapidamente lançadas ao ar mostram bastante de sua capacidade; no entanto, a canção perdeu o que tinha de melhor – o seu balanço.

Respondendo a questão inicial, Eldar mostra neste álbum um senso musical apurado que pode ser observado nas passagens mais lentas, mas sobretudo se destacam a clareza e a limpidez de seu dedilhar.

Faixas de Live at the Blue Note:
01. What Is This Thing Called Love [Porter] 8:00
02. Someday [Eldar] 9:37
03. You Don't Know What Love Is [DePaul, Raye] 6:12
04. Daily
Living [Eldar] 8:18
05. Dat Dere [Timmons] 9:39
06. Besame Mucho [Skylar, Velázquez] 8:10
07. Straight, No Chaser [Monk] 7:02
08. Sincerely [Eldar] 5:51
09. Chronicle [Eldar] 10:33
10. Take the "A" Train [Strayhorn] 2:50

Ouça um pouco do álbum no site oficial de Eldar.

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Abaixo trechos em vídeo da apresentação:


sábado, 26 de julho de 2008

Decodificando Rudresh Mahanthappa

Rudresh Mahanthappa é um nome muito importante para o jazz do século XXI. Figura constante na votação dos melhores do ano da revista Downbeat, ficou com o segundo lugar como Estrela do Jazz em Ascensão no sax alto de 2006. A influência da música indiana de seus ancestrais é tema corrente na musicalidade de Mahanthappa. Codebook, lançado em 2006 pela gravadora Pi Recordings, é o álbum mais recente de Rudresh Mahanthappa como líder. De acordo com o site oficial do saxofonista, as composições desse CD são derivações de métodos e conceitos de criptografia e teoria numérica.

Codebook abre com “The Decider”, que logo de cara deixa claro que o que se vai ouvir não é um estilo musical tradicional. Velocidade e ritmos asiáticos são as primeiras abordagens que o sax alto de Rudresh Mahanthappa oferece ao ouvinte, que logo está envolto em Avant-Garde Jazz de tirar o fôlego. A seção rítmica do baterista Dan Weiss e do baixista François Moutin imprimem um andamento veloz que se soma ao sax do líder, enquanto o piano de Vijay Iyer ganha destaque por imprimir consistência ao todo.

“Refresh” é uma bela canção que combina muito bem o sax alto de Mahanthappa com o piano de Iyer. A partir de um tema indiano, a melodia se desenvolve e o resultado é Post-Bop de qualidade que quebra barreiras convencionais e extrapola os limites do gênero nascido na América do Norte.

O balanço de “Enhanced Performance” é conseguido pelo bom entrosamento do baterista Weiss e do baixista Moutin, enquanto Mahanthappa é responsável por imprimir velocidade e energia à canção com sua exuberante atuação no sax. Com a maneira rápida e “pesada” de Iyer ao piano, a canção atinge o clímax.

“Further and in Between” mostra a versatilidade de Mahanthappa ao passar de um tema melodioso para um tema rápido e depois alternar novamente entre os dois. Aos sopros de outros saxofonistas essa canção poderia ser uma balada, mas com Mahanthappa ela é um belo exemplo de jazz de vanguarda, que consegue ser ao mesmo tempo suave e áspera. Tudo está muito bem encaixado nesta canção, pois a seção rítmica é precisa e Iyer mostra por que é um dos principais pianistas do jazz do século XXI.

“Play It Again Sam” é agradável aos ouvidos, pois mostra a virtuosidade de Mahanthappa, que extrai um belo Post-Bop – beirando o Free Jazzcom uma sutileza que chega quase a um quê de romantismo. “Frontburner” é, ao contrário da faixa anterior, seca e toda marcada pela espontaneidade dos músicos que se entregam ao Free.

Em “D (Dee-Dee)” ganham destaque o baixo de Moutin e o piano de Iyer, que fazem as alternâncias de sonoridade e transformam essa em uma canção escorregadia, que leva o ouvinte para um lado e depois o conduz por curvas. A imagem de uma serpente era constante em minha mente ao ouvir essa canção.

“Wait It Through” é um Post-Bop de primeira qualidade com um trabalho conjunto do quarteto muito bom. Cada instrumento é acrescido à canção com precisão e fazem tanto nos solos quanto na totalidade um trabalho primoroso. Ecos de John Coltrane e Eric Dolphy podem ser percebidos à distância, mas Mahanthappa tem sua própria maneira de tocar e compará-lo aos grandes do passado é apenas uma maneira de referenciar, e elogiar por extensão, mas jamais reduzi-lo. Mahanthappa é um dos grandes nomes da atualidade e pode ser o maior em alguns anos.

“My Sweetest” retoma a melodia sax à indiana para se transformar em uma bela balada ao melhor estilo do convencional jazz norte-americano. Será? A seção rítmica, mas principalmente Weiss, está aqui para mostrar que esse quarteto ainda anda sobre as linhas do Post-Bop. Mahanthappa e Iyer formam uma dupla de ouro para o jazz atual e nessa faixa cada um demonstra o porquê dessa afirmação.

Faixa de Codebook:
01. The Decider [Mahanthappa] 7:04
02. Refresh [Mahanthappa] 6:36
03. Enhanced
Performance [Mahanthappa] 6:09
04. Further and in Between [Mahanthappa] 8:14
05. Play It Again
Sam [Mahanthappa] 7:06
06. Frontburner [Mahanthappa] 3:46
07. D (Dee-Dee) [Mahanthappa] 5:54

08. Wait It Through [Mahanthappa] 6:10
09. My Sweetest [Mahanthappa] 6:21

Ouça um pouco do álbum na site oficial de Rudresh Mahanthappa.

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quarta-feira, 23 de julho de 2008

Como é Avishai Cohen em performance? Fabuloso!

O álbum As Is... Live at the Blue Note, do baixista Avishai Cohen, lançado pela gravadora Halfnote em 2007, é composto por um CD e um DVD com performances gravadas em 31 de agosto e 1º de setembro de 2006 no Blue Note Jazz Club em Nova York. Isto é jazz de primeira qualidade, que certamente ficará na memória de quem presenciou essas performances fantásticas. Esse se tornou um CD obrigatório para quem gosta ou quer conhecer o melhor do jazz do século XXI.

O CD abre com “Smash”, uma bela e envolvente canção sustentada pelo balanço que Avishai Cohen tira de seu baixo acústico, pelo toque de modernidade do tecladista/pianista Sam Barsh, as batidas certeiras e precisas do baterista Mark Guilliana e pelo toque de hard/post bop do saxofonista soprano Jimmy Greene, que faz aparição como convidado. Imagino alguns puristas do jazz torcendo o nariz nos primeiros acordes desta canção (confesso que o meu nariz virou um pouco para a esquerda!), mas após os primeiros 35 segundos eu estava conquistado e seguindo no ritmo cativante dessa canção. Quando Barsh passa do teclado para o piano, eu estava seguindo no embalo do grupo.

Na canção seguinte, “Elli”, o grupo entra em uma viagem mais intimista com direito a Cohen usar a caixa de seu baixo como percussão e a um agradável pizzicato. “Etude” é uma canção que cresce de algo semelhante a uma sonata para uma celebração de ritmos funk com toque latino com as participações dos convidados especiais Diego Urcola ao trompete e Greene ao sax tenor. Uma performance de perder o fôlego.

Com “Bass Suite #1”, Cohen traz o baixo acústico para o front acompanhado pelo toque refinado de Urcola. O baixista brilha ao “batucar” a caixa do instrumento e tirar pelas notas das cordas ao mesmo tempo.

“Feediop” é um dos melhores momentos do álbum. Apesar do grupo ser verdadeiramente um trio baixo-piano/teclado-bateria, o acréscimo dos instrumentos de sopro trouxe um acréscimo de qualidade muito grande ao conjunto. Nessa canção, Greene soa totalmente integrado ao piano bem marcado de Barsh, bem como à condução que Cohen dá à musicalidade e ao toque refinado de Guilliana, que marca o ritmo com um certeiro comedimento, que nãoespaço a exageros. É simplesmente ótimo ouvir esses músicos juntos.

“Remembering” traz uma beleza rara, que arranca aplausos do público antes mesmo da canção terminar. Méritos para Barsh, que transforma o trabalho em uma tocante obra-de-arte.

A única canção não composta por Cohen nesse álbum é um dos temas mais famosos do jazz: “Caravan” de Duke Ellington/Juan Tizol. Nessa faixa Cohen deixa para trás o seu baixo acústico e toca o elétrico, do qual tira um som galopante funky com muito balanço, enquanto Barsh levanta do banquinho do piano para tocar sua melodica em acompanhamento ao sax soprano de Greene. O resultado é o grupo conseguindo extrair muito swing do trabalho conjunto.

O DVD tem algumas faixas que não estão no CD, mas também omite outros presentes na outra mídia. A primeira canção é “Feediop”, depois “Samuel”, inédita no CD, que Cohen escreveu para o pianista Sam Barsh. Uma ótima oportunidade para presenciar a música refinada do trio e observar a perfeita integração dos músicos no crescendo e nas variações de velocidade da canção.

“One for Mark” é uma daquelas músicas para se deixar levar e apenas seguir o ritmo. Mais um bom momento do show. EmNu Nu” Barsh tem a oportunidade de demonstrar mais uma vez a sua ótima técnica, enquanto Cohen e Guilliana, após o solo de piano, fazem um dueto empolgante. As demais canções que compõe o DVD são “Smash”, “Remembering” e “Caravan”. O DVd apresenta um ótimo trabalho de câmeras com uma filmagem que deixa o espectador na primeira fila do Blue Note Jazz Club de Nova York.

CD
01. Smash [Cohen] 10:30
02. Elli [Cohen] 7:01
03. Etude [Cohen] 10:20
04. Bass Suite #1 [Cohen] 6:04
05. Feediop [Cohen] 7:28
06. Remembering [Cohen] 6:02
07. Caravan [Ellington, Tizol] 14:47

DVD
01. Feediop [live] [Cohen]
02. Samuel [live] [Cohen]
03. One for Mark [live] [Cohen]
04.
Nu Nu [live] [Cohen]
05. Smash [live] [Cohen]
06. Remembering [live] [Cohen]
07. Caravan [live] [Ellington, Tizol]

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Veja um pouco da performance de "Feediop":

sábado, 19 de julho de 2008

As trilhas de Coleman rumo à inovação

Steve Coleman é uma daquelas figuras do jazz que serão lembradas por criar algo novo dentro deste gênero musical. Importante referência no jazz atual, Coleman é um dos fundadores do movimento M-Base (“macro-basic array of structured extemporization” ou macro-básico arranjo de improvisação estruturada), que consiste em uma extensão do free funk de Ornette Coleman com maiores lacunas na música, imprevisíveis ritmos funk e uma nova lógica de solar, definindo-se em uma complexa teorização musical de integrar funk, soul, world music e jazz.

No álbum On the Rising of the 64 Paths, lançado em 2003 pela gravadora Label Bleu, Steve Coleman And The Five Elements fizeram um grande trabalho que será apreciado por quem prestar bastante atenção ao som do grupo. Recém chegados ao jazz devem ter dificuldades com esse álbum.

Na primeira faixa do CD, “64 Path Bindings”, o sax alto de Coleman e a bateria de Sean Rickman parecem seguir uma direção mais frenética como quem anseia por chegar, a flauta sem pressa de Malik Mezzadri segue sabendo que o destino não fugirá, o baixo acústico de Reggie Washington faz o cenário, enquanto o baixo elétrico de Anthony Tidd marca um tempo diferente com grandes espaços como se tocasse só. Mesmo dissonante em uma primeira ouvida, todos os instrumentos se encontram em meio a tanta diferença e fazem dessa uma gostosa canção para se ouvir com atenção.

“Mist and Counterpoise” apresenta uma bela ambientação solene, que é disfarçada por um solo elegante do sax alto. Os dois baixos fazem uma bela contraposição, pois enquanto o acústico, aliado ao trompete, mantém o ritmo lento da canção, o elétrico acompanha o sax e flauta na bela melodia produzida por Coleman e Mezzadri.

As vocalizações ao modo Oriente Médio de Mezzadri que abrem “Call for Transformation” são as mesmas que encerram, mostrando o movimento cíclico na canção, que tem um tema muito bem marcado e constante com os baixos e o trompete. Não apenas nesta canção, mas em quase todo o álbum, as composições de Coleman provam que o baixo acústico de Washington e o trompete de Jonathan Finlayson conseguem suprir a falta de um piano no sexteto.

“The Movement in Self” é introspectiva e abusa nas lacunas e espaços deixados na música. Rickman, Washington e Tidd dão o ritmo lento, mantendo o ouvinte em suspense, enquanto Coleman faz o jogo de oferecer e esconder a melodia. Uma grande canção que requer dedicação do ouvinte para compreender todas as nuances que o grupo fornece.

A única canção do álbum que não foi composta por Coleman é “Dizzy Atmosphere”, de Dizzy Gillespie., e que nesse momento soa quase como uma provocação, afinal depois de tantas melodias lentas, por vezes arrastadas, a versão enérgica tocada pela banda contrapõe tudo queem On the Rising of the 64 Paths. Coleman parece dizer que seu macro-básico arranjo de improvisação estruturada integra tão bem o bebop quanto o funk, os ritmos latinos e sons étnicos.

Com “Eight Base Probing” o grupo apresenta um tema contínuo que mostra a beleza da integração entre o sax alto, o trompete e a flauta tanto quando desenvolvem o mesmo tema como quando se destacam para solar. O sexteto consegue levar a música a um ponto alto ao rumar em direção às fronteiras do hard bop, do funk e do free jazz, mas sem nunca ultrapassá-las. Talvez por ser uma das canções mais acessíveis do álbum, este seja um de seus destaques.

“Fire Revisited” é uma experimentação musical que, primeiramente, nasce da concordância de todos tocarem o mesmo tema repetidamente até que o baixista acústico Washington é abandonado na tarefa de seguir com o mote para que os demais possam desenvolver seus solos até que o próprio Washington abandona o tema e deixa o baixo elétrico de Tidd levar a canção até um hiato de mais de dois minutos. Depois é surpresa de Coleman e não serei eu que irei estragá-la contando.

Faixas de On the Rising of the 64 Paths:
01. 64 Path Bindings [Coleman] 6:58
02. Mist and Counterpoise [Coleman] 6:42
03. Call for Transformation [Coleman] 10:43
04. The Movement in Self [Coleman] 6:16
05. Dizzy Atmosphere [Gillespie] 6:07
06. Eight
Base Probing [Coleman] 12:47
07. Dizzy Atmosphere (alternate take) [Gillespie] 7:09
08. Fire Revisited [Coleman] 13:37

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quarta-feira, 16 de julho de 2008

Todos ao mar com Ingrid Jensen

Lançado em 2006 pela Artist Share, At Sea, é um álbum forte e vigoroso com o melhor do post-bop e alguns mergulhos perigosos que quase alcançam o artificial smooth jazz. A trumpetista canadense Ingrid Jensen vai além de suas inspirações em Miles Davis e conduz seu grupo em composições inéditas e poucos standards.

A canção "At Sea" é construída sobre as linhas ditadas pelo trompete, que são seguidas por uma ambientação quase new age produzida em especial pelo estilo peculiar do baterista Jon Wikan e pelo tecladista Geoff Keezer. "Cymbal Storm" é ao mesmo um complemento da faixa anterior, um breve solo de pratos de Wikan e uma introdução a "Captain Jon", talvez a melhor canção do álbum por demonstrar a harmonia existente entre os membros da banda. Enquanto Wikan e o baixista Matt Closehy ditam o ritmo, Jensen e Keezer, ao piano, conduzem em alternância e depois mutuamente a viagem marítima do capitão Jon. Essas três primeiras canções contam uma aventura de barco no Alasca.

"As Love Does" revela-se uma ótima balada muito bem trabalhada por Keezer e Closehy, na qual cada nota é bem trabalhada para encontrar complemento no estilo "quero ser Miles Davis" de Jensen. "Tea and WaterColors" conta com a participação do guitarrista Lage Lund que se une ao grupo em uma canção com uma melodia mais pop que o habitual para esse CD. A versão de Jensen para "There is No Greater Love" de Jones e Symes é uma deliciosa canção construída em cima dos fraseados elegantes de Jensen. Outro bom momento do álbum é "Everything I Love", composição de Cole Porter, que conta com a participação do percussionista Hugo Alcázar. "Swotterings" é uma boa canção para se acompanhar, mas sem grandes surpresas, o que pelo menos garante um bom momento de apreciação do trabalho desses grandes músicos. A última faixa chama-se "KD Lang", uma homenagem à artista pop canadense, e é repleta de mudanças de andamento, tanto que soa como uma balada no início para depois transformar-se em um fusion discreto e passar por um hard bop acelerado e vigoroso e encerrar na calmaria. Imprevisível como o mar.

Todos os músicos que participaram do álbum:
Ingrid Jensen: trompete, flugelhorn;
Geoffrey Keezer: piano, Fender Rhodes, teclado;
Jon Wikan: bateria, cajón, palmas, percussão;
Matt Clohesy: baixo;
Lage Lund: guitarra (5, 8);
Hugo Alcázar: cajón, batajón, djembe (7).

Faixas de At Sea:
01. At Sea [Jensen] 4:22
02. Storm [Wikan] 0:40
03. Captain Jon [Keezer] 6:45
04. As Love Does [Jensen] 9:29
05. Tea & Watercolors [Keezer] 7:41
06. There Is No Greater Love [Jones, Symes] 5:39
07. Everything I Love [Porter] 9:13
08. Swotterings [Jensen] 10:02
09. KD Lang [Jensen] 12:27

Ouça um pouco de At Sea no próprio site de Ingrid Jensen.

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segunda-feira, 14 de julho de 2008

A face tragicômica de Vijay Iyer

Tragicomic é o título do novo álbum do pianista hindu-americano Vijay Iyer lançado em abril de 2008 pela gravadora Sunnyside. Eleito como primeira estrela em ascensão entre os pianistas de jazz e primeira estrela como compositor pela pesquisa dos críticos internacionais da revista Downbeat em 2006 e 2007, Iyer retoma sua carreira como líder depois de se aventurar em vários outros projetos.

O novo álbum traz 12 faixas, sendo 9 composições do próprio Iyer, com destaques para "Macaca Please", "Aftermath", "Age of Everything", "Threnody", "Becoming". Mesclando velocidade com suavidade, Tragicomic alterna uma sonoridade agressiva com toques de belo lirismo. Embora não tão denso quanto em seus álbuns anteriores Iyer, demonstra sua elegância ao dedilhar as teclas de seu piano com energia e precisão. O que é tragicômico nesse álbum? À primeira vista o fato de Iyer ter colocado o piano à frente dos demais instrumentos e não ao lado para explorar a
força do conjunto como um todo como em seus CDs anteriores como Reimagining e Panoptic Modes. O que se ouve então é um quarteto soando diferente, mas diferente não significa mal. Tragicomic é um grande álbum, que investe menos na sonoridade indiana das raízes do pianista para arriscar mais nas levadas do piano e das bem colocadas batidas do baterista Marcus Gilmore, que emprega um ritmo mais pesado, que por vezes consegue fazer um belo contraponto com a suavidade que Iyer emprega em determinados momentos como na faixa "Window Text". O baixista Stephan Crump está muito bem colocado nestas gravações e dá ao grupo um belo acabamento, fazendo com que a sonoridade fique muito bem fechada. Confesso que senti falta de mais participação do excelente alto saxofonista Rudresh Mahanthappa, de quem sou fã. "Machine Days" é a faixa que Mahanthappa encontra melhor espaço dentro do álbum. Nos discos anteriores de Iyer, com mais influências de world music, o sax era um destaque tão -- e por vezes mais -- importante quanto o piano. A mudança de sonoridade nas composições de Iyer deixaram o fabuloso Mahanthappa um pouco de lado.

"Comin' Up", composição de Bud Powell, é uma demonstração clara de como Vijay Iyer consegue seguir com seus experimentalismos e incursões por músicas étnicas sem se esconder em novas roupagens do jazz. Nessa canção, ele mostra que tem talento para ser um grande pianista em qualquer época.

Vijay Iyer é um dos expoentes do jazz do século XXI. Tragicomic marca uma mudança de sonoridade para o artista, que somente nos próximos anos saberemos se foi o melhor caminho a ser seguido. Por ora, este é um disco altamente recomendável para os leitores deste blog.

Todos os músicos que participaram do álbum:
Vijay Iyer: piano;
Rudresh Mahanthappa: saxofone alto;
Stephan Crump: baixo;
Marcus Gilmore: bateria.

Faixas de Tragicomic:
01. The Weight of Things [Crump, Gilmore, Iyer, Mahanthappa] 2:17
02. Macaca Please [Iyer] 4:54
03. Aftermath [Iyer] 6:20
04. Comin' Up [Powell] 4:22
05. Without Lions [Iyer] 2:54
06. Mehndi [Iyer] 6:50
07. Age of Everything [Iyer] 5:24
08. Window Text [Iyer] 5:43
09. I'm All Smiles [Leonard] 4:44
10. Machine Days [Iyer] 7:28
11. Threnody [Iyer] 6:08
12. Becoming [Iyer] 3:38


Ouça Tragicomic no site do próprio Vijay Iyer.

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Vijay Iyer divide a capa da edição de julho da Downbeat com Jason Moran e Matthew Shipp: